Capítulo 11
EUROPA
_ É isso! – gritou exultante, Iosef. – Venha Tomás, vamos ver isso!
Tocou em um dos símbolos da parte de baixo e diversos caracteres começaram a aparecer na tela.
_ Isto é um computador, Tomás! Veja esta série de caracteres, parecem formar um quadro de opções.
_ Mas não conhecemos esta escrita, podemos apagar todos os programas que estão aqui.
_ Acho que os criadores desta máquina não fariam um programa que fosse tão fácil de ser destruído, vamos seguir em frente, e apertar uma opção qualquer. É melhor do que não descobrir nada.
E Iosef apertou uma opção na tela, que foi para outro quadro, um pouco diferente, onde ao lado dos caracteres, havia desenhos.
_ Parecem desenhos conhecidos, parece um sol, uma lua crescente... São símbolos de figuras do espaço... Um cometa, que interessante, são coisas que encontramos em todo o universo, pelo menos acho que são.
_ É verdade, Iosef, talvez este seja algum mapa ou algo semelhante.
_ Talvez Rena possa nos ajudar - disse Tomás, e solicitou a presença dela através do cerétalo. Logo ela também estava ali admirando aquela tela.
_ Já vi esta escrita antes, através de símbolos, de uma cultura muito antiga, inclusive, não compreendíamos todos os símbolos. Talvez eu possa traduzir. Esperem, vou fazer melhor, vou tentar transferir este conhecimento para vocês, mas precisaremos contatar os computadores de Marte, vamos lá, vou ajudá-los, estão prontos?
_ Estamos, mas não conseguiremos fazer isto!
_ Por que, Iosef?
_ Estamos muito distantes de Marte, não conseguiremos contato fácil através do cerétalo e este contato pode levar alguns dias, é melhor que solicitemos aos computadores da nave que requeiram estas informações, quando as tivermos nele, poderemos usá-las.
_ Iosef tem razão, Rena. Depois, eu não quero correr o risco de sofrer alguma intervenção terrestre no meu cerétalo. Nossa viagem é um risco. É melhor solicitarmos aos computadores da nave.
_ Certo, então faremos isto.
Rena fez as solicitações e alguns dias terrestres se passariam até que estas retornassem à nave, quando, então, elas estariam disponíveis.
Enquanto aguardavam pelas informações, os três continuaram manipulando o computador para tentar entender o objeto. Rena tinha sua teoria:
_ Para mim, é muito difícil acreditar que esta cápsula tenha vinte mil anos. Estamos em pouco mais de três mil depois de Cristo, em dezessete mil antes de cristo, o homem mal fazia desenhos nas cavernas...
_ Raramente o identificador erra no cálculo, a poeira mais externa grudada na cápsula tem esta idade. – disse Iosef. Qual seria outra possibilidade?
_ Pensei em outra civilização, tentei lembrar de antigas lendas terrestres que falavam de Atlântida, ou de deuses que vinham em naves de fogo, em lendas que falam que o homem já destruiu a civilização terrestre há vinte mil anos atrás voltando a selvageria.
_ Isso tudo, nós sabemos ser impossível.
_ Pensei, também, em civilizações de outros sistemas solares. Civilizações alienígenas, por exemplo. Poderíamos estar diante da prova da existência de outras vidas inteligentes fora do nosso sistema solar. – disse Rena.
_ Seria uma possibilidade – comentou Tomás. Mas não tenho certeza, se uma civilização alienígena esteve em nosso sistema solar há vinte mil anos atrás, teríamos de descobrir porque ela não retornou aqui, porque não se misturou aos seres humanos, além do que, esta cápsula parece ser construída por seres humanos, o filme que assistimos é, claramente, de um ser humano. Se admitirmos isso, teremos de admitir que a humanidade é mais antiga do que acreditamos e teremos de admitir de que a humanidade não começou na Terra, mas em outro sistema solar, e de que há humanos em outro sistema solar.
_ Isto poderia ser verdade e poderia explicar muita coisa. Disse Iosef. E teríamos de refazer toda a teoria de nossa origem.
_ Vamos aguardar mais informações dos códigos antigos que poderão nos ajudar a decifrar este mistério.
Três dias depois, o computador da nave recebeu as informações dos códigos, Tomás chamou os companheiros de viagem para fazer a transferência de dados. Iosef contestou:
_ Não, Tomás, eu não quero receber tudo direto no cerétalo, gostaria de aprender esta escrita antiga lendo as informações, poderíamos imprimi-las em papel e fazer um livro que consultaríamos, ou apenas ler nas telas de nossos computadores.
_ Estou te estranhando, Iosef, para que isso? Nós só temos um computador com tela, quase não temos papel na nossa nave. Eu vou receber via cerétalo, mesmo. Desta vez, parece-me muito mais prático e objetivo.
_ É uma escolha sua. Eu gostaria de tentar aprender como se aprendia antigamente, usando o cérebro, acredito que isso me dará uma interpretação diferente das coisas.
_ Faça como quiser. Nós vamos respeitá-lo.
Rena e Tomás se conectaram mentalmente com o computador da nave e receberam as informações sobre as antigas escritas terrestres que eram semelhantes àquela. Depois disso, retornaram à cápsula para ler as informações nela contidas. Durante todo o prazo de espera das informações, o andróide Quebec trabalhou em compreender os sistemas geradores de energia da cápsula. Também, durante este tempo, o andróide conseguir consertar a escotilha de acesso de tal forma a permitir que ela se fechasse e abrisse hermeticamente, ainda com a ajuda de força mecânica.
E começaram a interpretar o que continha a cápsula, até que atingiram um ponto que julgaram crucial, os dois discutiam cada frase que surgia, tentavam interpretações e formavam a história da cápsula. Reviram todas as partes, comparavam com os códigos das línguas terrestres mais antigas, inclusive de línguas de povos indígenas extintos. Revisavam o que achavam compreender, e foram num trabalho que lhes consumiu algumas semanas terrestres a ponto de estar a uma semana distante de Europa. Iosef não os acompanhou naquela tarefa, continuou estudando os antigos códigos lendo-os na tela do computador.
Quando finalmente pensaram ter encontrado uma resposta, Rena e Tomás decidiram contar a Iosef o que haviam descoberto. Reuniram-se os três na cápsula, pois havia alguns recursos interessantes nela que utilizariam para explicar a história para Iosef. Foi Tomás quem começou.
_ Iosef, acho que nós descobrimos o que aconteceu com esta cápsula e acho que você vai ficar surpreso, tanto quanto nós ficamos. Veja só – e ele apertou alguns comandos na tela da cápsula, algumas imagens em filme tridimensional começaram a aparecer, mostravam pessoas comuns em um lugar comum. – Depois disso, descobrimos muita coisa que se assemelha mais a uma negociação, há códigos semelhantes a códigos numéricos. Pareceu-nos que esta cápsula fazia parte de uma nave maior, uma nave de comércio semelhante a nossa.
Rena completou:
_ Pudemos reconhecer nas imagens, símbolos representando produtos agrícolas comuns como arroz, soja, milho e feijão. Estamos surpresos. Se esta é uma nave comercial e foi construída pelos humanos, é possível então, trabalharmos com duas teorias. A primeira de que a medição da poeira colada ao casco da nave está incorreta, a segunda é de que existiu mesmo uma civilização evoluída, anterior à nossa, há pelo menos vinte mil anos atrás.
_ Inacreditável – disse Iosef. Vocês já refizeram o teste de idade do material? Sei que parece uma pergunta óbvia...
_ Sim, Quebec nos trará o resultado em pouco tempo, mandamos testar também aquela folha que encontramos aqui dentro. Vamos comparar as idades dos objetos. Solicitamos um teste mais completo.
_ Pensei que encontraríamos as respostas para as nossas questões anteriores, aquelas que nos trouxeram até aqui, mas acho que não podemos ainda saber porque nossa produção de grãos está sumindo, ou porque ela é maior do que o necessário para a nossa sobrevivência – disse Iosef.
Tomás observou:
_ É, talvez a resposta para esta questão esteja mesmo em Europa, mas esta cápsula também é muito estranha, temos um segundo mistério aqui para resolver e estas questões não podem ser explicadas pelo cerétalo.
Pouco depois, Quebec chegou.
_ Senhores, o resultado da análise da poeira cósmica e da folha de papel do interior da nave é o mesmo. Ambos possuem a mesma idade. Vinte mil anos.
_ Não é possível! – disse Rena. Se ambos têm a mesma idade, esta nave tem, realmente, vinte mil anos. De onde ela veio? Há vinte mil anos não existia civilização capaz de construí-la.
_ Será que não? Será que nosso conhecimento está errado? – completou Tomás. Precisamos continuar pesquisando esta cápsula, ela deve ser a maior e mais importante descoberta arqueológica de toda a existência humana. Quebec, quando você acredita que terá codificado as fontes de energia desta cápsula por completo, precisamos que todos os computadores aqui existentes nela possam funcionar para decifrarmos tudo o que pudermos.
_ Alguns dias, senhor, não consigo definir um prazo exato, o teste dos equipamentos ficará pronto em dois ou três dias.
_ E é uma cápsula extremamente importante! Deve possuir conhecimentos que a humanidade não tem e que poderiam ser úteis para a expansão da colonização humana no sistema solar e até para outros sistemas. Por isso, acho que deveríamos estudá-la com muito cuidado. Sem contar que o procedimento correto é entregá-la aos cuidados do governo central terrestre.
_ Sim, Rena está certa – disse Tomás – mas eu gostaria de aproveitar o máximo que pudermos dela, mas não haverá tempo suficiente, estamos a poucos dias de Europa e, mesmo esta pequena história que obtivemos é cheia de falhas porque não conseguimos traduzir tudo._ Vamos aguardar mais um pouco. Estamos muito próximos de Europa e não quero surpresas por lá.
A aproximação de Europa iniciou-se com muito cuidado por ser muito grande a interferência de Júpiter e seus anéis formados de grande quantidade de resíduos de rochas e gelo. A atração gravitacional de Júpiter obrigava a gastar muito combustível nas manobras e sempre havia o risco de ser atingido por algum pedaço de rocha errante dos tênues anéis jupiterianos.
Aos poucos a nave foi entrando na atração gravitacional do gigantesco planeta e posicionando-se para o encontro com Europa que foi surgindo como uma pequena esfera que se aproximava, faltando ainda mais de um mil quilômetros para chegar, já podiam avistar as grandes placas de gelo que o formavam.
Rena e Tomás estavam acompanhando o procedimento de aproximação, Iosef aguardava na sala de comando olhando a grande esfera de gelo crescendo a sua frente. Ele estava sentado e concentrado naquela aproximação e percebeu quando duas pequenas naves saíram de Europa e se aproximaram.
Então, ouviram pelos auto-falantes da nave, o chamado de uma delas:
_ Atenção tripulação da NETC-EMB 4011, seu pouso foi autorizado, por favor, acompanhem a nave guia até o local de aterrissagem.
Tomás comentou:
_ Que estranho, acompanhar a nave guia, nunca vi isso acontecer. Quando estes procedimentos ocorrem, Rena?
_ Em algumas ocasiões especiais, quando há risco de colisão com algum objeto em órbita, por exemplo, ou quando há uma ocasião de escolta militar... eu não sei porque estão solicitando acompanhamento à nave guia. Acredito que seja devido ao grande número de objetos em órbita de Júpiter.
Europa foi tomando, magnífica, o horizonte da nave. Os oceanos de gelo iam crescendo, e, como a atmosfera de Europa era menos agressiva que a da Terra, as naves não sofriam com a entrada no satélite, injustamente chamado assim porque era, na prática, um pequeno planeta prisioneiro de Júpiter. Na entrada, sentiram apenas uma turbulência grande, depois viam-se as nuvens e, por baixo, o oceano eternamente congelado.
A nave desceu e voou a cerca de um quilômetro de altura por sobre o oceano, o local de pouso era um dos poucos pedaços de terra firme que existiam naquela lua. A nave guia pousou na pista descendo horizontalmente. Por ser maior, a NETC-EMB teria um pouco mais de dificuldade de fazer esta manobra, e, devido às baixas temperaturas, e ao gelo constante na pista, era muito arriscado descer de maneira tradicional. Manobraram a nave para reduzir a velocidade ao mínimo suficiente para não cair. Em baixa velocidade, os motores de descida foram acionados e se combinaram com os motores de vôo horizontal, apesar de alguma dificuldade, conseguiram aterrissar, mas, ao tocar o chão da pista, a nave sofreu um deslize rápido devido ao excesso de gelo e água, a movimentação foi suficiente para jogar os três tripulantes para fora de suas cadeiras.
Havia um local correto marcado na pista para se descer e foi ali que pousaram a nave. Iosef percebeu que aquele não era um espaço porto comum por não haver uma torre de comando à vista, tentou imaginar o motivo, mas não conseguiu, não queria utilizar o cerétalo para descobrir isso, tentava manter-se anônimo ou, no mínimo, indisponível para não ter a mente vasculhada, depois que aprendera a usar o próprio cérebro, surgiu nele uma certa antipatia ao que antes lhe era muito comum, a falta de privacidade em seus pensamentos.
Pousando no local determinado, ouviram a voz do comando do espaço porto.
“Atenção! Aguardem para a entrada na cidade subterrânea”.
Logo, o chão abaixo deles começou a descer e perceberam que tinham descido num enorme elevador que os levou a um grande compartimento fechado. Orientaram-lhes a sair do piso do elevador e fizeram a nave rodar até fora do piso, ainda dentro do compartimento. Atrás deles, o enorme piso voltou a subir e puderam ver os grandes tubos que sustentavam aquela plataforma que se encaixou perfeitamente no teto acima.
“Atmosfera artificial restabelecida”.
As paredes do compartimento em que estavam deslizaram suavemente para dentro do chão e a cidade subterrânea surgiu aos seus olhos, estendendo-se por quilômetros para todos os lados, onde se viam muitas ruas e algumas pessoas caminhando, alguns veículos trafegando também.
Tomás verificou os dados externos.
_ Teremos que usar nossas roupas de frio aqui. A temperatura ambiente é de cinco graus Celsius. – avisou aos seus companheiros.
Baixaram a rampa de acesso até o solo. Desceram até o chão, lá embaixo, uma mulher sorridente os aguardava.
_ Olá, vocês são Tomás, Rena e Iosef, certo? Fizeram uma boa viagem? Eu sou Karen Duran e vou acompanhá-los aqui em Europa. Estão com muito frio?
_ Sim. – respondeu Tomás que tomou a frente na caminhada, seguindo ao lado de Karen.
Karen explicou alguns detalhes a Tomás sobre Europa.
_ Aqui embaixo a temperatura média é de zero grau, lá em cima, nesta época do ano, a temperatura é de vinte graus negativos, vocês chegaram no nosso verão, no inverno chega a mais de sessenta graus negativos na superfície, não conseguiríamos sobreviver se não construíssemos estas cidades subterrâneas.
_ Muito interessante, mas eu pensava que havia menos pessoas aqui em Europa, parece que está bastante habitada.
_ Estamos em quase um milhão de pessoas vivendo aqui. É uma fronteira do espaço, mas estamos conseguindo nos manter. Adaptamos as diversas plantas em estufas que estão na superfície, conseguimos trazer algumas espécies de peixes da Sibéria, muito resistentes ao frio. Nosso problema inicial era fazer com que toda a cadeia alimentar dos peixes funcionasse sob a grossa camada de gelo, mas acabamos criando uma espécie de fito-plâncton que pode sobreviver sem a luz direta do sol, apenas com o aquecimento da pequena atividade vulcânica daqui de Europa.
_ Aí a cadeia alimentar pode se formar...
_ Sim, injetamos oxigênio na água, forma-se o fito-plâncton, zôo-plâncton, micro-crustáceos, peixes, de certa forma, Europa tem uma vida animal mais rica que Marte. Conseguimos uma cadeia sustentável. Acreditamos que a evolução natural tratará de criar novos seres vivos que povoarão todo o oceano interno de Europa. Por enquanto, confinamos toda esta vida em pequenos lagos que podemos controlar, mas é o suficiente para sustentar esta população.
_ Muito bom. E você saberia nos dizer porque fomos trazidos por uma nave guia.
_ Sim, claro. Havia ameaça de uma tempestade de neve muito forte, nestas ocasiões, trazemos as naves que nos visitam para que sigam rotas que não encontrem a tempestade. Eu gostaria que vocês me acompanhassem, vou levá-los ao administrador do espaço-porto de Europa, para fazermos os contatos necessários. Sabemos que tem uma grande carga de milho.
Ela os orientou a entrar num carro aéreo que os levou pelas ruas da cidadela. Iosef observava atentamente o caminho que o carro aéreo fazia e mantinha-se calado. Cada rua era, na verdade, um túnel de formas retas, recortadas em noventa graus e exatas, a entrada quadrada de cada um, com vinte metros de cada lado. Quando percorriam o túnel, via-se que em cada parede o padrão era sempre o mesmo. A cada dez metros havia uma porta de entrada para os edifícios, cada residência ou unidade tinha os mesmos dez metros de lado e vinte metros de altura e cinco pavimentos, divididos exatamente a cada quatro metros de altura. As janelas eram muitas, cada porta se distinguia da outra apenas pelo número fixado em frente. A monotonia do túnel era evidente. A Iosef, que, a cada dia sem usar o cerétalo, ficava mais sensível às formas e imagens, aquela paisagem lhe era muito desoladora, triste e deprimente, tudo branco, gelado, exato e monótono. Lembrou-se dos subterrâneos da Lua com seus caminhos sinuosos seguindo as rochas menos duras. Talvez aqui fosse mais fácil ser assim, mas talvez, pensava, os humanos fossem mais criativos nos primórdios da colonização espacial.
Por sorte, cada túnel não tinha mais que cem metros de extensão, e, a cada cruzamento, havia pequenas praças e pontos comerciais coloridos nas esquinas o que reduzia a tristeza daqueles subterrâneos.
O carro aéreo estacionou em um dos cruzamentos, todos desceram e entraram em um dos prédios, em pouco tempo, viram-se defronte o administrador, um sujeito sorridente também, parecia muito tranqüilo, apresentou-se:
_ Como vão vocês, eu sou Richard Leroy, sou o administrador do espaço-porto principal de Europa, fizeram boa viagem até aqui?
_ Sim, fizemos. – disse-lhe Rena.
_ Vocês trazem uma grande carga de milho, estamos pagando o preço atual de sessenta e três U.M. por tonelada, acredito que é o preço que lhe passaram quando saíram de Marte.
_ Sim, este mesmo. – disse Tomás.
_ Ótimo, nosso almoxarifado vai conferir a carga e vocês poderão receber em três dias terrestres.
_ Muito bom.
_ Soubemos também que vocês trouxeram uma carga a mais que conseguiram adquirir no caminho, algo muito precioso.
Tomás adiantou-se:
_ Do que exatamente você está falando?
_ Da cápsula que encontraram no cinturão de asteróides. Vocês sabem que qualquer coisa encontrada no sistema solar pertence ao governo da Terra e aquela cápsula é muito diferente de qualquer coisa encontrada no sistema solar.
_ Sabemos – disse Tomás – não temos intenção de ficar com ela, mesmo porque temos consciência de que isto seria um crime, gostaríamos de pedir a autorização do governo terrestre para levá-la em nossa nave de volta à Terra. O senhor poderia conseguir isto para nós.
_ Posso fazer o pedido ao governo central, mas não posso garantir que serei atendido, de qualquer forma, a resposta vai demorar um pouco, talvez um mês terrestre ou mais, a burocracia é grande, vocês sabem. Porque não aproveitam e curtem um descanso por aqui? Não temos muito a oferecer, mas vocês vão gostar de Europa.
_ Obrigado, senhor Richard.
_ Enquanto vocês ficarem aqui, por medida de segurança, iremos retirar a cápsula de sua nave e guardá-la em um depósito. Temos alguns cientistas aqui muito interessados nela.
_ Deixe-a em nossa nave até recebermos a resposta da Terra. Ela não nos incomoda e nós não utilizaremos a nave e nem viajaremos sem sua autorização – pediu Tomás tentando conseguir um tempo a mais com a cápsula.
_ E os cientistas que querem estudá-la?
_ Nós teremos o máximo prazer em leva-los até a cápsula, conversar com eles e lhes passar as informações que adquirimos enquanto estivemos com a cápsula, além do que, podemos autorizar a livre circulação deles pela nossa nave. Mesmo porque, talvez você não possa, legalmente, retirar a cápsula de nossa nave. Devo lembrá-lo do protocolo 104.490 que trata dos objetos encontrados no espaço.
_ Não precisa, conheço. Correto, posso atender o seu pedido. Manteremos a cápsula em sua nave.
Depois desta conversa, Karen os levou a um dos hotéis de Europa e lhes deixou o carro aéreo para sua locomoção. Após se instalarem, quando finalmente estiveram sem ninguém por perto, Iosef manifestou sua preocupação para Tomás e Rena.
_ Estou com uma sensação estranha aqui em Europa, acho que não deveríamos deixar a cápsula aqui. Temos de retornar para Marte o quanto antes. Devemos esquecer temporariamente os nossos propósitos por aqui.
_ Não podemos fazer isto agora Iosef. – disse Tomás. Estamos no local que queríamos para saber o que está acontecendo no sistema, temos pelo menos um mês para fazermos nossas pesquisas e colhermos informações. É tempo suficiente. Precisamos continuar.
_ Acho que precisamos voltar.
_ Mas por que, Iosef? – perguntou-lhe Rena.
_ Por que eu sinto que não encontraremos nada aqui. Uma parte da produção do sistema vem para cá, aqui há um milhão de pessoas, não tínhamos esta informação, achávamos que eram menos, mas porque não soubemos disso em Marte? Há algum erro nos dados dos computadores? Desconfio que estamos enganados em nossos estudos.
_ É isso que precisamos saber Iosef! Se estamos errados ou não! É por isso que viemos aqui!
_ E a cápsula, porque foi tão fácil achá-la? Desculpem-me se questiono tanto, mas, sem usar o cerétalo, eu estou começando a ficar muito confuso. As questões estão ficando sem resposta. Estou muito inseguro.
_ Volte a usar o cerétalo, Iosef. – disse-lhe Rena.
_ Não quero, este é o detalhe, não quero. Quero compreender com minha própria capacidade. Estas são as questões: nós viemos para cá sem saber se era aqui mesmo o local que queríamos. Encontramos uma cápsula importantíssima que em mil anos nunca havia sido encontrada, chegando aqui, o governo central da Terra já sabia do nosso feito. Depois, querem que fiquemos pelo menos um mês aqui. Não está certo tudo isso. Parece-me tão confuso. Parece-me que há algo errado, desculpem-me, mas o não uso do cerétalo que me leva a tantas questões. Quando eu o usava, tudo era mais fácil de compreender.
_ Claro que era, Iosef. –interviu Tomás. Claro, o cerétalo o ajudava a compreender porque as informações vinham prontas, mas acredito que você deve tentar aprender a mesclar as duas formas, assim como eu faço.
_ Tomás está certo, Iosef. Mescle as duas formas de pensar e você conseguirá melhores resultados, tenho certeza.
_ Há outros problemas, agora que sei contatar qualquer cerétalo, não consegui fazê-lo com alguns habitantes de Europa, desconfio que eles também não permitem o acesso livre ao cerétalo, se é verdade. Também conhecem sua fórmula.
_ Pode ser, a fórmula não é secreta.
_ Mas não é isso, parece que eles utilizam um sistema mais avançado de cerétalo, um sistema que não é utilizado pelos outros – disse Iosef.
_ Como assim?
_ Eu tentei contatar as pessoas no caminho que fizemos até aqui, apesar da quantidade, todas estavam com os cerétalos à disposição. Mas houveram duas pessoas que não consegui, eles estavam com os cerétalos à disposição e, ao mesmo tempo, não estavam, era como se tivessem outro sistema dentro deles, ou como se tivessem dois sistemas, um era acessado mas eu percebi outro que não era acessado.
_ Isto é muito estranho – disse Rena.
Neste momento, os três recebem a notícia de Quebec de que ele conseguira restaurar o sistema de força principal da cápsula e fazer com que todos os sistemas estivessem disponíveis.
Tomás olhou para Iosef e Rena e afirmou.
_ Vamos imediatamente para a nossa nave, se Quebec conseguiu restaurar os sistemas, talvez possamos descobrir mais alguma coisa.
Assim fizeram.
Os três estavam novamente dentro da cápsula. E tentavam compreender o significado de cada símbolo que aparecia na enorme tela.
_ O que nós sabemos até o momento? – perguntou Tomás aos companheiros.
Rena colocou os pontos para todos:
_ Sabemos que a cápsula tem vinte mil anos, foi construída por seres humanos e fazia parte de uma nave maior, projetada para transporte de grãos pelo espaço.
_ Sim, é isso! –falou Tomás – Se era usada para transporte de grãos, temos de ter um ponto de partida e um ponto de chegada, talvez, se procurássemos os pontos. Ou símbolos que se assemelhassem a estes pontos, poderíamos descobrir mais alguma coisa, como, por exemplo, se eles viajavam até outro sistema solar.
_ Então, pesquisemos.
Todos procuravam interpretar cada sinal que surgia, aos poucos, compreendiam melhor aquela escrita de símbolos.
Rena quem identificou um ponto diferente.
_ Vejam, isto, parece um dos pontos de parada da nave, parece a nossa lua.
_ É verdade, é muito semelhante, aqui deve ser a Terra, vejam, sim, é a Terra (ao tocar no símbolo, a imagem da Terra surgiu).
Junto com a imagem da Terra, surgiram dezenas de números escritos em algarismos arábicos, facilmente reconhecíveis.
_ Incrível, estes algarismos nós conhecemos!
_ Isto complica muito mais as coisas porque, se conhecemos estes algarismos, quem fez esta cápsula são seres humanos como nós. É impossível! – disse Rena.
Ao mesmo tempo, os três recebem um aviso via cerétalo de que deviam deixar a nave porque a polícia iria levar o objeto, os guardas estavam do lado de fora da nave. Aguardariam cinco minutos para que eles saíssem sem o uso da força. Tomás comentou:
_ Eles prometeram que não tocariam em nossa nave e que poderíamos continuar nosso trabalho pelos próximos trinta dias pelo menos.
_ Algo os fez mudar de idéia. Precisamos negociar com Richard e Karen, precisamos de mais tempo, estamos descobrindo coisas muito interessantes – disse Rena.
Iosef nem se preocupou muito, continuou olhando aqueles símbolos e tocando a tela, buscando novas informações, estava compreendendo cada vez mais as mensagens, disse aos dois:
_ O que temos aqui são as coordenadas de viagem, vejam, o ponto de partida, o ponto de chegada, a viagem, está estranho, parece que saem do mesmo lugar em que chegam, não é compreensível.
_ Deixe, Iosef – disse Tomás. Devemos negociar com eles, acredito que o comando terrestre é mais rápido do que pensávamos...
_ Vão, vão indo, vou aguardar a polícia, assim que ela chegar eu saio, não posso parar agora.
Tomás e Rena se olharam e, instantaneamente, tiveram a mesma idéia, atrasariam o máximo a entrada dos policiais para que Iosef tivesse mais tempo de pesquisar. Saíram da cápsula e depois da nave.
Lá fora, um pequeno batalhão de seis guardas tendo à frente, Richard acompanhado de Karen e, ao lado deles, outra mulher que não conheciam.
Tomás se dirigiu a Richard:
_ Então, prefeito, houve alguma mudança de planos?
_ Sim, Tomás. Deixe-me apresentar-lhe a senhora Míquias Afargos, ela é a embaixadora do governo central em Europa, levamos, por obrigação, todas as informações a ela, que decidiu retirar a cápsula de sua nave, sendo ela a maior autoridade no planeta, não posso descumprir sua ordem.
_ Senhora Afargos, não pode fazer isso agora, estamos obtendo resultados interessantes, aquela cápsula é muito importante para a arqueologia humana. É um achado e tanto, se tirar de nossa nave, pode até mesmo danificá-la.
_ Compreendo a sua preocupação senhor Magril, mas os nossos cientistas precisam de acesso ilimitado a este objeto.
_ A senhora deve cumprir os protocolos...
_ Todo protocolo é suspenso quando se trata de objeto identificado como perigoso à humanidade. Este é o caso. Vamos entrar e retirar o senhor Biron e, depois, a cápsula nos será entregue, por favor, não ofereça resistência!
Tomás e Rena se afastaram. A embaixadora entrou, acompanhada dos guardas, de Richard e Karen e fez sinal para que os dois também entrassem.
_ Por favor, leve-nos até a cápsula!
_ Pois não, senhora, é por aqui.
Tomás e Rena foram a frente até o depósito em que guardaram a cápsula. Todos se postaram à frente da porta do depósito, Tomás aguardou até que todos chegassem, procurando atrasar ainda que poucos segundos a chegada na cápsula, então, apertou o botão para abrir.
A porta do depósito se abriu, ainda foi possível a todos verem a cápsula sumindo num leve clarão emitindo um fraco zumbido, em menos de cinco segundos, não havia mais cápsula nem Iosef.
Capítulo 12
VIAJANTE
Iosef sentiu um estranho mal estar e logo se recuperou. Levantou-se e saiu da cápsula. Imediatamente, viu que não estava mais dentro da sua nave e nem em Europa. À sua frente, uma praça de concreto com edifícios muito antigos, algumas árvores e poucas pessoas caminhando nas ruas. Lojas. Pelo céu azul e pelo Sol brilhante, pensou estar na Terra, mas estranhou porque estava em Europa até pouco tempo atrás. Retornou para dentro da cápsula, sentou-se de frente ao painel e tentou lembrar-se do que fizera, da seqüência de códigos que apertara, dos números. Estava confuso, não conseguia imaginar sequer onde estava. Ligou o cerétalo em seu cérebro, tentou captar as ondas de rádio do planeta e conectar-se com os habitantes. Teve dificuldade em entender as pessoas e as mensagens lhe pareciam muito confusas, sua comunicação com o mundo exterior falhava. Saiu da cápsula novamente.
Olhou a praça e caminhou. Percebeu-se na Terra, a mesma sensação de peso, a mesma luz. O calor agradável do Sol. Olhava as pessoas e não reconhecia os rostos, todos tão indiferentes a tudo. As paredes dos prédios mostravam as mais diversas cores e imagens que se alteraram ininterruptamente. Pessoas, objetos, animais, plantas, as imagens se alternavam, assim como os nomes dos produtos anunciados em enormes placas.
Entrou em um prédio e algumas pessoas que estavam no saguão o olharam com certa estranheza e depois voltaram aos seus afazeres. Iosef circulou por ali com a certeza de que todos sabiam o que estavam fazendo, menos ele. Sentou-se em uma poltrona marrom do saguão. Olhou a sua volta, em outra poltrona, uma mulher olhava o indefinido, parecia em outro mundo. Havia uma mesa onde dois homens pareciam tomar um café em absoluto silêncio. Tudo era silêncio, tanto que Iosef sentiu uma vontade primitiva de gritar. Conteve-se. Ficou observando as pessoas para compreender alguma coisa.
A mulher levantou-se após alguns minutos e se aproximou da parede, levantou o braço direito e apontou a mão para a parede, onde vários símbolos começaram a surgir, o olhar de Iosef acompanhou a mulher e viu os símbolos na parede, alguns eram semelhantes aos que vira na cápsula. De alguma maneira, ele estava no local de onde a cápsula saíra, mas necessitava ainda saber que lugar era este. A mulher fez passar vários símbolos e, de repente, ela sumiu, simplesmente, evaporou-se. Como se fosse etérea, feita apenas de vapor.
Iosef se levantou e se aproximou da parede do saguão, levantou o braço direito e apontou a sua mão de maneira idêntica a que fez a mulher. A parede se acendeu e ele começou a buscar os símbolos que reconhecera na cápsula. Usou e abusou daqueles símbolos, tentando compreender uma seqüência lógica. Desistiu. Voltou ao sofá.
Alguns minutos depois, surgiu do nada um homem de frente a aquela parede, como se materializasse ali, o homem começou a andar calmamente e saiu pela porta do saguão.
Iosef compreendeu que, se alguma forma, aquela parede era uma espécie de portal ou de transporte, de materializador ou desmaterializador que levava as pessoas para os lugares desejados. Com certeza, muito mais lhe passou pela cabeça.
Resolveu aproximar-se dos homens que tomavam café. Pegou uma cadeira e sentou-se ao lado deles, tentou comunicar-se, primeiro com o cerétalo e não conseguiu. Tentou iniciar uma conversa com eles.
_ Por favor, preciso de ajuda.
Os dois o olharam e não falaram nada. O que estava a direita de Iosef lhe falou alguma coisa em uma língua incompreensível. Iosef repetiu a pergunta e ele tornou a falar-lhe naquela língua que ele não compreendia e nem conseguia traduzir com o seu cerétalo.
O homem que estava à esquerda levantou-se, foi até a parede, estendeu o braço para a parede acender. Tocou diversos símbolos, como se lesse e escrevesse na parede. Voltou, sentou-se, falou com Iosef em sua estranha língua incompreensível. Parecia pedir-lhe que aguardasse e Iosef esperou. Alguns minutos depois, materializou-se uma mulher de idade indefinida, como eram indefinidas as idades de todos aqueles habitantes. Ela se aproximou da mesa, eles conversaram algo sobre Iosef. Ela estendeu a mão esquerda a Iosef, ele a pegou, ela o puxou e o carregou para perto da parede, estendeu o braço, acendeu o portal, mexeu com vários símbolos e, de repente, ambos estavam em outro local, em outro prédio, Iosef compreendeu imediatamente que fora transportado de um lugar para outro, mas não conseguia entender como era possível isso. No outro prédio, dois homens aguardavam, seguraram-no e o levaram para dentro de uma sala.
Uma outra mulher surgiu e tentou estabelecer algum contato com Iosef, ele não a compreendia e nem ela o compreendia, ele começou a dizer-lhe quem era, de onde viera, qual era o seu nome. Parecia um selvagem do século dois largado no centro de São Paulo do Século Vinte e Um. Então, veio-lhe a idéia mais primitiva de comunicação que conhecia. Apontou o próprio peito e disse:
_ Iosef.
A mulher compreendeu imediatamente. Ela o apontou e lhe disse:
_ Iosef.
Depois, apontou para si mesma e disse:
_ Tamina.
_ Tamina!
Iosef exclamou feliz, acabara de conhecer a primeira pessoa naquele estranho mundo. Tamina. Brincou apontando para ela dizendo Tamina e para si mesmo dizendo Iosef.
Ambos riram. Estabeleceu-se, finalmente, a primeira comunicação entre eles, conheciam-se.
Iosef se agachou e tentou desenhar no chão um círculo, querendo dizer que veio de um planeta. Tamina o compreendeu, tocou em seu ombro, fez um gesto para que ele se levantasse, levou-o até a parede. Gesticulou com o braço e a parede se acendeu, tocou em alguns símbolos. Depois, com o dedo em forma de lápis, começou a desenhar na parede. Parou, fez um gesto para Iosef, indicando-lhe a parede e lhe indicando que fizesse o mesmo.
Iosef começou a desenhar o sistema solar como tentativa de mostrar-lhe de onde viera. Desenhou o Sol e os oito planetas do sistema, escreveu o nome dos planetas, indicou Marte e apontou com o dedo para si e para Marte. Depois escreveu a data que partiu de Marte.
Tamina apenas o olhou. Parecia um pouco incrédula. Depois, ela lhe falou:
_ Sol, Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno.
Iosef compreendia aquelas palavras e lhe disse:
_ Sim. Eu vim de Marte. Iosef, Marte.
Ela respondeu:
_ Tamina, Terra.
_ Terra?
Iosef não acreditava. Ela era da Terra? Então, onde estavam? Ele indicou o chão e apontou o sistema solar. Tamina indicou o chão e apontou para a Terra.
Iosef voltou a mostrar Marte, escreveu na parede os números do ano do sistema solar. 2999.
Apontou Marte, apontou para si e apontou para o número 2999.
Tamina compreendeu o que ele queria dizer, apontou a Terra, apontou para si, e escreveu os números do ano do sistema solar: 22.999.
Iosef teria desmaiado se não fosse o cerétalo a regular os hormônios e fluidos de seu corpo. Vinte mil anos teriam se passado desde que ele tocara os símbolos da cápsula.
Tamina apontou a parede, trocou diversos símbolos e, novamente, ambos estavam em outro local, de frente a um homem de barbas brancas. Tamina conversou com ele naquela estranha língua. O homem falou alguma coisa. Ela tocou a parede e desapareceu.
O homem falou com Iosef.
_ Olá, meu nome é Igor.
_ Igor, você me compreende?
_ Sim, compreendo, estudei as línguas antigas e conheço a sua língua, podemos nos falar.
_ Onde estamos?
_ Na Terra.
_ Impossível, eu estava há pouco tempo em Europa, no ano de 2.999.
_ Sim, acredito em você, mas agora, estamos na Terra no ano de 22.999.
_ Vinte mil anos à frente do meu tempo! Como é possível viajar assim no tempo? Não era impossível?
_ Sim, era impossível, agora não é mais. Você teve muita sorte, não sei ainda como posso escondê-lo de um contato maior com este mundo, vamos tomar um café.
_ Ainda se toma café?
_ Tem certos hábitos que nós não perdemos. Vamos à cozinha!
_ Você vai me transportar para lá através da parede?
_ Oh! Não! A cozinha é aqui ao lado.
Iosef acompanhou Igor, a cozinha possuía uma mesa e algumas cadeiras, apenas isso. Igor convidou Iosef a sentar-se, quando ambos estavam instalados, ele tocou na mesa, esta se acendeu, ele procurou os símbolos corretos que indicavam o café, em poucos segundos, duas xícaras de café quente se materializaram em cima da mesa.
_ Pode tomar, é de excelente qualidade.
_ Obrigado. Por favor, Igor...
_ Sim?
_ Explique-me como você faz o café surgir aqui na minha frente, ele se materializa sozinho, como é isso?
_ Ah, são os tele transportadores, você já os viu em ação, nós os usamos para tudo, para irmos de um local para outro, para prepararmos nossas refeições, tudo o que você pode imaginar.
_ Continuo sem compreender. Como esta xícara de café pode surgir aqui em cima da mesa.
_ Surgindo, o tele transportador faz com ela chegue aqui.
_ É isto que quero saber, de onde ela vem? Como ela se materializa aqui?
_ Simples, eu faço o pedido aqui na mesa, você me viu fazendo a solicitação, então, ela é materializada no local em que pedi. Depois que tomamos, solicito que ela retorne, então, ela será tele transportada para outro local. Existem dispositivos mapeando constantemente este ambiente, não há como materializar a xícara fora do seu lugar.
_ Voltando ao assunto anterior, foi assim que cheguei aqui?
_ Sim, mas, no seu caso, também utilizamos o fator tempo e espaço, transporte através do tempo é um pouco mais complicado.
_ Para mim, era impossível, ainda acho impossível estar vinte mil anos à frente do meu tempo.
_ Asseguro, você está vinte anos à frente de seu tempo. Para nós, as viagens no tempo são corriqueiras.
_ Desde quando?
_ Começamos com as viagens no ano de 16.745, muita teoria e energia foi gasta, e conseguimos voltar no tempo até o ano de 2.997, mas as viagens para antes de 16.745 foram proibidas em 16.755, desde então não contamos mais o tempo da mesma maneira que vocês porque não há mais fatos históricos, uma vez que suprimimos o antigo conceito de história em 16.745. Se podemos ir tanto ao futuro quanto ao passado, suprimimos este conceito anterior de história e tempo. Ainda marcamos o ano solar, somente para facilitar a vida, por isso sei que estamos em 22.999.
_ Muito interessante. E o que aconteceu com o cerétalo? Vocês não o têm mais?
_ Cerétalo? Faz séculos que não ouço mais esta palavra! Sim, nós não os temos mais, temos circuitos internos mais desenvolvidos, são implantados quando alguém nasce e eles crescem com os indivíduos. Não é mais o que você conhece.
_ Porque quando alguém nasce? Também era assim com o cerétalo...
_ Porque faz muito tempo que ninguém nasce.
_ Como assim?
_ Creio que há mais de duzentos anos não temos um nascimento, as pessoas que estão no mundo são as mesmas dos últimos séculos. Não há necessidade de nascer uma vez que praticamente ninguém morreu nos últimos três séculos.
_ É muita informação para mim, acho que preciso descansar, também preciso aprender a língua de vocês. Vocês tem algum programa antigo que eu possa usar para aprender sua língua?
_ Acho que posso arrumar isso, vamos arrumar um lugar para você descansar, você também precisa aprender a usar nossos símbolos para se locomover no nosso mundo. Venha comigo.
Igor se aproximou da parede de tele transporte, tocou nos símbolos corretos e ambos estavam, em segundos, num quarto.
_ Você dorme aqui esta noite. Ao lado tem um banheiro, no outro compartimento uma pequena despensa com alguns alimentos, se você sentir fome. Fique à vontade. Se quiser roupas limpas, há alguma coisa neste armário. Fique tranqüilo, este quarto pertence ao centro de pesquisas em que trabalho.
_ Ok, obrigado. Vou tentar dormir.
Igor se retirou e, sozinho, Iosef desligou o cerétalo e ficou pensando sobre o mundo que encontrara. Adormeceu certo de que ainda haveria muito para aprender, inclusive, como voltar para o mesmo instante em que saíra do seu mundo.